INTRODUÇÃO

Durante o acompanhamento pediátrico, a avaliação do crescimento é feita de forma sistematizada e permite a identificação precoce de uma série de agravos à saúde da criança. Porém, durante este acompanhamento, outro ponto fundamental é a vigilância do desenvolvimento.

A avaliação do desenvolvimento de uma criança consiste em um processo contínuo de acompanhamento das atividades desempenhadas por esta criança e permite a detecção precoce de desvios e atrasos.

CONDUTA E DESENVOLVIMENTO

Chamamos de desenvolvimento neuropsicomotor o conjunto de todas as reações da criança, todo o seu comportamento que evolui progressivamente ao longo do tempo sob a forma de funções e habilidades cada vez mais específicas. Esses comportamentos, exemplificados pelas reações da criança ao meio, são, nas fases iniciais da vida, reações reflexas e estereotipadas e que, progressivamente, vão se tornando voluntárias e aprendidas. As bases fisiológicas que explicam esta evolução neuropsicomotora assentam-se no próprio crescimento somático e desenvolvimento (mielinização, formação e remodelamento sinápticos) das vias motoras, sensitivas, sensoriais, de linguagem, raciocínio e memória dos sistemas nervoso central e periférico.

Estudar o desenvolvimento neuropsicomotor infantil implica avaliar o ganho de funções e habilidades nas cinco grandes áreas ou condutas:

Conduta adaptativa: compreende as reações da criança frente aos estímulos apresentados (ex.: bola, argola, chocalho, cubos), e que dependem da interação da sua capacidade motora, sensorial, de coordenação e cognitiva para adequada exploração e aprendizagem. É considerada a conduta precursora da inteligência, aquela na qual é avaliada a capacidade da criança em "resolver" problemas e aprender a partir de novas experiências. Por exemplo, ao mostrar um chocalho ao lactente de quatro meses, espera-se que ele leve a mão à linha média para observar o objeto, podendo levá-lo à boca para iniciar a exploração;

Conduta motora fina: compreende as habilidades cada vez mais precisas e específicas com o uso da mão e dedos, garantindo-lhe a exploração cada vez mais delicada do objeto. É muitas vezes estudada juntamente com a conduta adaptativa. Por exemplo, espera-se que um lactente tenha uma pega palmar aos quatro meses, uma pega radial aos sete meses, e uma pega em pinça (oposição entre o polegar e o indicador) aos 12 meses;

Conduta motora grosseira: compreende as habilidades motoras gerais, como sustentar cabeça, tronco, sentar-se, rolar, engatinhar, andar, pular e assim por diante. Também é uma conduta dependente da interação das vias motoras centrais e periféricas, assim como órgãos dos sentidos especiais e vias de equilíbrio;

Conduta de linguagem: refere-se à capacidade de compreender e exprimir sensações e pensamentos. Inclui as reações de comunicação não verbal (ex.: sorriso, riso alto, choro, apontar, expressões faciais) e verbal (sons guturais, balbucio, lalação, primeiras palavras, frases, histórias);

Conduta pessoal-social: refere-se às reações da criança frente às outras pessoas (mãe, pai, examinador, brincadeiras com outras crianças) e frente às situações de vida diária (alimentação, sono, higiene, vestimenta, controle esfincteriano). REGRAS GERAIS

A sequência do desenvolvimento neuropsicomotor ocorre no sentido céfalo-caudal, proximal-distal e da borda ulnar-borda radial. Por exemplo, o lactente adquire primeiro o controle de cabeça, para depois adquirir o controle de tronco, o sentar, o engatinhar e o andar; primeiro é adquirida a capacidade proximal de levar as mãos à linha média para depois se aprimorar a capacidade de preensão; a pega é palmar ulnar inicialmente, e com a evolução se torna uma pega palmar radial, para depois alcançar o controle mais fino que é o de pega em pinça (oposição entre polegar e indicador).

REFLEXOS PRIMITIVOS

Os reflexos primitivos são respostas motoras estereotipadas deflagradas por estímulo externo do examinador, e representam as primeiras reações do recém-nascido ao meio. São chamadas "primitivas" porque não são voluntárias ou aprendidas, e estão sob controle de centros subcorticais, tronco encefálico e medula. Possuem um caráter transitório, isto é, podem estar presentes ao nascimento, mas possuem uma época determinada para desaparecer. O desaparecimento do reflexo primitivo permite o surgimento de uma conduta motora voluntária, aprendida e sob controle cortical, o que é possível fisiologicamente pelo processo de amadurecimento do sistema nervoso central – que envolve mielinização e formação de sinapses. Por exemplo, o reflexo tônico cervical assimétrico está presente até o terceiro mês de vida, e o seu desaparecimento nesta época é fundamental para permitir o desenvolvimento da postura simétrica, com cabeça e tronco centrados e mãos na linha média com início da preensão palmar voluntária. Ainda neste contexto desenvolvimentista, a permanência de um reflexo primitivo além da idade preconizada é um sinal patológico e pode anunciar a presença de alguma doença neurológica de base impedindo que o córtex assuma o controle das funções cognitivas e motoras. Abaixo descreveremos os principais reflexos primitivos. O momento exato do desaparecimento de cada um destes reflexos é bastante controverso na literatura.